sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Ano Novo

Gustave Thibon 
(1903-2001)

A virtude cristã da esperança não tem relação com o mito do progresso. Quando Mistral nos exorta "a fé num ano novo", esta confiança no futuro, fundada na comunhão com as origens do ser, nada tem de comum com o "sentido da história" dos progressistas modernos. Não é a transposição no futuro das promessas da eternidade, é a fé na eternidade que se projecta sobre o futuro.
Eu creio também no ano novo. O que distingue a minha esperança da dos adoradores da história, é que eles crêem na virtude intrínseca e necessária da transformação, num futuro certamente melhor que o passado---e isto por efeito do poder criador de tudo o que perdura, ou, se são crentes, num plano divino da história, pelo que a vida terrestre ir-se-á aproximando cada vez mais da vida celeste. Eu, porém, não creio nem no passado nem no futuro como tais; acredito sòmente na eternidade que nos cinge e pode penetrar todas as horas do tempo, se soubermos acolhê-la. Porque Deus, que está presente em todos os pontos do espaço, está igualmente presente a todos os minutos da duração. Crer no futuro, é crer que o amanhã está já contido no seu hoje eterno. Mas isto nada tem que ver com a fé num desenvolvimento contínuo da virtude e da felicidade sobre a terra. Eu não penso que o que vier a acontecer amanhã valerá necessàriamente mais do que as eventualidades de hoje; penso, o que é diferente, que Deus não abandonará nunca aqueles que n'Ele crêem---suceda o que suceder.
É possível que o futuro nos reserve terríveis repressões, mas essas catástrofes temporais não fecharão as portas da eternidade (quem sabe, mesmo, se não ajudarão a abri-las?). O que importa não é que as coisas vão melhor ou pior no tempo, é o vinco que deixa no fundo eterno da alma este melhor ou pior: quid hoc ad aeternitatem?
A história tem, na verdade, um sentido, pois Deus não permite que o universo dure em vão; ora este sentido situa-se fora da história, isto é, não na sequência dos acontecimentos temporais, mas no seu reflexo, no fundo do espelho móvel da eternidade. O tempo é como um caminho à beira do abismo da morte; após algumas horas de marcha, as gerações caem sucessivamente neste abismo. O que conta e dá à história o seu verdadeiro sentido, não é o facto de o caminho ser mais sombreado ou árido, mais direto ou acidentado, mas o que o abismo divino acolhe ou rejeita das colheitas da morte.

Fonte: "O olhar que se esquiva à luz" - Livraria Figueirinhas - Porto, 1957

Uma civilização não pode durar sem elites verdadeira


 Marcel de Corte
(1905-1994)


Já não se preocupam as famílias com a formação do caráter e dos costumes de seus rebentos: ou elas lhes buscam estabilidade e segurança, em lugar de insuflar a vitalidade que lhes permitiria chantar-se no real e traçar o próprio caminho na vida, ou então os abandonam sem guias ou apoio, o que dá no mesmo: ante o temor supersticioso do futuro, procuram salvaguarda, proteção e defesa contra os riscos e os golpes da fortuna. Não há como ser diferente numa sociedade privada de modelos e de elites que os encarnem. Para os adolescentes desvitalizados, o diploma aparece como a única saída, porque ele é o caminho mais fácil, não obstante o peso dos programas. Eles não dão a menor importância – e como poderiam? – aos fatores essenciais à vida: o caráter, a retidão da vontade, a honra, o dever, o senso moral e estético, etc., mas julgam somente a inteligência formal – o diploma é que faz o homem.
Segue-se que a sociedade moderna se inclina, sob a força desse peso, para o mandarinato. A idolatria do pergaminho é sinal indubitável da perda da invenção. Já que não existe a fonte de renovação que é o exemplo, perde-se a faculdade da retomada. Não suscitam mais êmulos os santos, os gênios e os heróis, e os “grandes homens” não passam de criações aventadas pela publicidade. Apesar desse turbilhão, a sociedade moderna tende à estagnação. 
 
***
 
A conclusão a que chegamos, após análise tão alongada, será breve e clara: uma civilização não pode durar sem elites verdadeiras. É preciso que a sociedade as recupere, caso não queira submergir na barbárie. Diante dos olhos evidencia-se o inventário dos recursos – se ao menos nós o consultássemos! – em sua trágica antítese: por um lado, imensos meios de realização e técnica incomparável, conhecimento de detalhes elevado ao infinito; por outro, a ausência quase total da finalidade humana, o silêncio prodigioso sobre a questão fundamental: “para onde vamos?”, a derrocada do sentido de convergência. A saúde ameaçada da civilização depende da solução que daremos ao problema da rearticulação entre os meios e os fins. Ninguém duvida da dificuldade da solução; à primeira vista, o obscurecimento dos modelos vivos torna-a impossível. Por que é tecnicamente desenvolvida e humanamente atrofiada, perecerá a civilização?  De fato, isso não é nada. Se a grande cadeia dos modelos intermediários – os santos, os gênios e os heróis – perdeu o poder de atração, nos sobram nas extremidades dessa corrente dois tipos que ainda guardam o valor de exemplo: o Verbo Encarnado e o pai e a mãe de família. No cristianismo e no lar ainda se encontram inalteráveis os exemplos vivos da vida total. Nosso destino está preso à persistência dessa conjugação. Demais, a família cristã é o único lugar da terra onde ainda é possível, se quisermos, manter a elite. Se quisermos! Está tudo aí... Devem pai e mãe se comportar de tal maneira que os filhos possam admirá-los, aprová-los, imitá-los e descobrir neles os modelos de homem e cristão e os exemplos vivos de finalidade natural e sobrenatural; a subordinação dos meios aos fins reduz-se a um jogo quando se encarna lúcida e voluntariamente.
Destarte, pelo contágio do exemplo, hão de nascer elites novas, humildes, sólidas e verazes – no segredo do coração em oração perpétua, no segredo do lar de lume brilhante.
 
 
CORTE, Marcel de. L'homme contre lui-même. Éd. de Paris, 2005; págs 107-137.

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Feliz Natal


Pe. Emmanuel Andre

Nasceu o Menino Jesus!
 
Antes do advento dos séculos, Ele nasceu do Pai; nesta noite ditosa, Ele nasceu de Maria.
Da parte do Pai, Seu nascimento é todo resplendor e luz; da parte de Maria, é todo silêncio de noite profunda.
Mas nesta noite, Ele é luz. Nasceu, e de uma mãe virgem e de pai virgem e excelso; nasceu, e celebraram-No os anjos; nasceu, e Seu nascimento a Deus dá glórias e a nós a paz.

* * *

Neste mistério tudo é imenso! Quão sublime é Maria, ao dá-Lo ao mundo, ao envolvê-Lo em panos, ao aninhá-Lo na manjedoura, ao adorá-Lo e amá-Lo! Quão sublime é a Divina Criança, Ela está muda e parece que nada percebe à Sua roda, mas como fala aquele silêncio e quantas maravilhas declara! Abrem-se Seus olhos, não tanto para enxergar quanto para chorar, o coração é todo de amor.

Jesus, meu Deus! Amo-Vos acima de tudo.